27 de fevereiro de 2010

passarinho

Hoje estava na cozinha e a minha mãe pegava o pássaro que salvou pela manhã. Era estranho, mas bonito o bicho. Ele tinha asas, era preto, cinza, com um tom encarnado desmaiado sobre a sua cabeça. Minha mãe o salvou de uma morte sem afecto, salvou-o do vento que esganava a aurora sem raios de sol. Ele foi salvo. Ele era pássaro mas não voava. A força do seu ser não lhe fazia vontade. A minha mãe pegava-o pelas duas mãos. Pela tradição dos tempos antigos, azeite pelo bico é cura de doença, e assim lhe fez. Doença de certo tinha, aquele pássaro que não fugia. Ela chegou de rajada e impressionou mais que a tempestade que se adivinhava. Foi um momento de silêncio agonizante. Foi o momento do último respirar, do grito final da vida. Ficou contorcido o corpo que deixou de ter a alma. Vi anti-vida. Tive a percepção real do paralelo do universo. Tive a verdadeira noção do que é existir e deixar de ser. Adeus passarinho.

25 de fevereiro de 2010

ditado

"Pousaste para mim numa fotografia, foi a primeira vez de muito tempo que me olhaste de frente, de perfil e com um sorriso. Sentia falta deste teu eu, aquele que ficava comigo de mão dada a conversar. Dávamos as mãos porque gostávamos, não por obrigação, nem por um cliché de namorados. Não choveu nessa noite e tu bebeste vinho tinto, eu tinto com fruta. E demos um brinde, não com os copos mas com a alegria que os outros connosco partilhavam. Guardo agora comigo esse momento, está em formato digital. Longe de tudo o que é normal, numa pasta sem relevo. Lá estás tu a sorrir para mim, de copo na mão. Assim fico eu fantasiando com o dia em que te marquei, com o dia que ficou marcado lá longe no calendário. Só não entendo uma coisa, e que me faz imensa confusão. Porque me roubaste tu o coração? Porque me iludiste com tamanha sensação? Porque foste egoísta e não ganhaste coragem? Porque foste cobarde e desististe? Porque é que nunca mais me quiseste dar a mão? Porque tentei eu te dar a mão e tu a escondeste?(...)Porque fiquei eu à espera?(...)Porque tenho eu de fazer todas estas perguntas? Porque não tenho nenhuma resposta para elas? Porque é que existe o porque e não o ponto final, ou mesmo o de exclamação? Porque tenho eu de me perguntar quando irás tu responder? Porque é que eu não sou tua, nem tu és meu? Porque sinto eu inspiração quando penso em ti, se tu não me dás nada senão a solidão com o meu pensamento? Porque é que este pensamento me consome, a mim e ao meu coração? Coração esse que tens tu na tua mão. Pergunto-me se não o sentes. O mais espectacular é que está tudo à distância de uma pulsação."

22 de fevereiro de 2010

onãoterocomumnãosignificaonãoamor

Quase que sentia a tua pela tocar na minha, o teu cheiro a penetrar nas minhas sensações olfactivas. Foi um extasiar, extasiado. Eras um grego que falava latim dos tempos modernos. Um herói com espada de cortar corações, que desfez o meu. Eras grego e eu estrangeira. O nosso muro de Berlim era a língua que não nos entendia. Só a linguagem do corpo se fazia palavra e eu te escutava. Era muito mais minuciosa com a interpretação e por incrível que pareça era-me mais fácil de entender. Naquela tórrida tarde de inverno, em que a chuva caía em forma de pedra e nós sobre o nosso éden descasávamos, acordaste de sobressalto, não falaste comigo. Só vi as tuas costas ao longe, cada vez mais longe até parecer miragem. Não me preocupei, sabia que voltarias e ficarias comigo. A espera tornou-se a passagem do tempo, ele passou sem eu ver e sem te ver. O mundo me dizia todos os dias o teu adeus, mas não era o teu corpo que me falava, então não acreditava. Porque eu era a tua deusa e tu o meu grego. Naquela noite adormeci já sem lágrimas e mesmo sem estrelas no céu. Disseste nos sonhos voltei, mais, disseste na tua língua natal e eu entendi. Apenas sorri. Nesse instante abri o reflexo da minha alma e te vi, e senti a tua fala na minha, a fala universal do que é amor. Contigo a meu lado sabia que mesmo sem estrelas no céu seria Feliz.

9 de fevereiro de 2010

sday

Pela primeira vez não tenho conclusões, nem palavras, nem figuras de estilo todas janotas com que brincar. Hoje sinto que tenho um frasco cheio, condensado com magia, mas que está selado. Sei que se o libertasse só sairia magia negra. Inspiração com toda a gama de palavras e trocadilhos que levassem para o lado mau, que nos deixa sem apatia. É daqueles dias em que queria ter sido feliz, queria ter dado gargalhadas de sorriso aberto, queria ter visto um arco-íris, queria ter dado um passeio de baixo de um sol quente, queria ter sentido o coração bater acelerado. Queria sentir-me orgulhosa, talvez de conquista até de um outro sorriso, quem sabe. Mas neste dia nem palavras tenho para dizer. Um dia que me faz crescer, sem alegria. Tem de ser assim por vezes. Queria não as sentir cair pelo rosto, queria ter tudo menos o nó na voz. Queria ter uma inspiração boa. (Tal como a vida, que é uma fantasia real, vou pegar nas letras e junta-las para fingirem que são reais fantasia, vou juntar alegria, feliz, festa, amigos, mais um agitar, algo extraordinário, sou feliz).

4 de fevereiro de 2010

a Deus

Adeus é uma palavra bonita, mas não a gosto de pronunciar, nem pouco mais ou menos a escutar e ainda menos a sentir.

Uma palavra que me faz sentir o coração gelado, que me faz sentir apenas os olhos esmorecer com o cair do olhar ou o virar das costas, ou o para sempre. Eu nunca queria ter de dizer adeus ao amor, nem àqueles que mo fazem sentir. Sobretudo a estes últimos. É bom saber que pelo menos amei e os amei, que me amaram e quiseram-me amar. É bom sentir o adeus como forma certa de que houve amor, uma certeza ambígua. É um aperto, o adeus.

E se por prilipimpim o adeus não existisse, se fosse um até daqui a um instante de tempo tão pouco, que vivido, só me lembraria de novo de viver estando outra vez contigo. Sim, é bom saber que o meu adeus também pode ser este. Assim mesmo não gosto muito dele, por mais belo que no português e nas línguas do mundo inteiro o seja. O adeus é uma incógnita, separada por duas barras horizontais, uma sobre a outra, de um segundo termo, neste vem um mergulho no mar, sem volta, sem nunca mais provar o sol nem o ar, da esfera armilar por onde caminhamos a dizer adeus, um dia e outro. Até.

2 de fevereiro de 2010

monólogo a dois

eu: o comboio já passou?
eu: não sei.
eu: mas era o ultimo?
eu: se passou sim.
eu: e sabes se volta?
eu: se voltar é porque se esqueceu de alguém.
eu: pois eu devia tê-lo apanhado.
eu: então se ele notar volta.
eu: e se não notar?
eu: é porque não o devias ter apanhado.

1 de fevereiro de 2010

queen


Ouviste e pensaste em mim. Jah bless you.

note

"You are the best. You are the worst. You are average. Your love is a part of you. You try to give it away because you cannot bear its radiance, but you cannot separate it from yourself. To understand your fellow humans, you must understand why you give them your love. You must realize that hate is but a crime-ridden subdivision of love. You must reclaim what you never lost. You must take leave of your sanity, and yet be fully responsible for your actions."

Gnarls Barkley